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domingo, 16 de agosto de 2009

Gavetas

Domingo, dia de arrumar as gavetas. As do armário estavam cheias de papéis: usados, em branco, amassados, extratos, carnês, cartões de amigos passados - não sabia porque os guardava, os amigos já não eram os mesmos. Mas a saudade era apenas do tempo, de si mesma. Achou também desenhos de sua filha, na verdade rabiscos, mas que guardavam a marca do tempo.

...as gavetas do seu ser é que eram desarrumadas, mas uma doce desordem, que esconde o que quer e revela o que não quer. Estas continham também papéis: velhos, surrados, cansados, mãe, mulher, pessoa, filha, profissional e um meio tonto no meio dos outros - EU. Este era miúdo, tênue, tímido, mas possuía um brilho fosco e sedutor, daqueles que enternecem e sufocam. E foi neste que se perdeu...

No fim, as gavetas todas estavam da mesma forma, cheias de papéis, mas vazias. O domingo se foi. Ninguém veio, o sol deu seu último brilho e um sorriso esplendidamente amarelo. Sentiu os primeiros pingos de estrelas salpicarem sua visão e viu brotar a lua, não linda, mas pálida e sóbria. Os grilos do jardim invadiram sua casa e pularam pela sala, arriscando-se numa busca de espaço tribial.


Olhou as gavetas sombrias, como despedida, até breve.


(Valdira S. Rosa)


2 comentários:

Luana Rosa Bonaparte disse...

Achei lindo! Mas não entendi o porque do uso da terceira pessoa. Medo de tornar isso algo muito pessoal?

Salvador disse...

Adorei,