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segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Dança dos dias



Desfaço-me nas horas desse tempo seco

Me restabeleço nos dias, meses, anos

gradualmente, sem pressa


Arrumo as gavetas, são papéis, notas, cartas

Ah, as cartas…

Não sei porque parei de escrevê-las

Elas têm um quê de testamento (talvez por isso)


Arrumo armários, pastas, fotos

e me pego revivendo aquele passado retratado

estranho, ausente, nostálgico


A medida que arrumo, organizo,

me desalinho, entorto


Tudo organizado, olho ao redor

A bagunça interna é assustadora, voraz


Tento me equilibrar,

os olhos pesam, lacrimejam


Decido acender um incenso,

colocar uma música, dançar


Aos poucos a balburdia vai se camuflando entre uma sensação e outra

A dança se torna frenética,

o som é vibrante e sensual

A pele está úmida


Paro levemente, os pés descalços no chão frio

desço, sento, deito, rio


Recomeço então

arrumo os novos papéis, as imagens vívidas,

um talismã, um livro amado


Aos poucos também vão surgindo espaços

cantos de luz pálida, recantos floridos,

cheiros suntuosos vão brotando


Faço um chá,

de amoras.

Valdira Rosa