...as gavetas do seu ser é que eram desarrumadas, mas uma doce desordem, que esconde o que quer e revela o que não quer. Estas continham também papéis: velhos, surrados, cansados, mãe, mulher, pessoa, filha, profissional e um meio tonto no meio dos outros - EU. Este era miúdo, tênue, tímido, mas possuía um brilho fosco e sedutor, daqueles que enternecem e sufocam. E foi neste que se perdeu...
No fim, as gavetas todas estavam da mesma forma, cheias de papéis, mas vazias. O domingo se foi. Ninguém veio, o sol deu seu último brilho e um sorriso esplendidamente amarelo. Sentiu os primeiros pingos de estrelas salpicarem sua visão e viu brotar a lua, não linda, mas pálida e sóbria. Os grilos do jardim invadiram sua casa e pularam pela sala, arriscando-se numa busca de espaço tribial.
Olhou as gavetas sombrias, como despedida, até breve.
(Valdira S. Rosa)